domingo, 25 de outubro de 2009

O Desencanto (Uma História Verídica)

Quando encontrei aquele lugar pra morar,com aquele homem que até então era o homem da minha vida,achei realmente que seria minha última morada com meu último namorado.

O lugar era o seguinte...mas era o seguinte mesmo.

A porta da sala dava pra uma varanda que se estendia um quintal enorme.
- isso é um quintal! Meio abandonado? Meio abandonado.
Mas vou encher isso aqui de flores,trepadeiras,colocar uma mangueira e até uma piscina Toni? Vou! Vou encher isso aqui de flores,trepadeiras,colocar uma mangueira e até uma piscina Toni. Sempre sonhei com um quintal com trepadeiras e piscinas Tonis.
Na rua,que era uma rua tranquila e querida,tinha uma padaria.
- olha,meu amor! Uma padariazinha tipo de cidadezinha do interior. Que delícia! Podemos tomar café da manhã aqui.
E a casa era invadida sempre por um doce som de flauta. Beethoven. Que se fosse vivo,eu lhe tocaria os ombros,faria ele olhar bem pros meus lábios e diria “UMA COISA”(mudo).
Era nosso vizinho do andar de cima que nos presenteava com aquela bela peça.
Parecia um sonho aquilo tudo.
Casamos,mudamos e começamos a morar.

Na primeira manhã fomos acordados pelo doce som da flauta. Beethoven. A mesma bela peça. Uma manhã gostosa...tudo lindo. O sol penetrava o nosso quintal,ainda sem flores e sem piscina Toni,mas ainda nosso. Aquele homem lindo,com aquela cara amassada de acordar,mas ainda era meu homem.
Fomos à padaria,aquela da cidadezinha do interior.
- muito bom dia,meu amigo. Vou querer um misto quente.
- não tem chapa,não.
- então um misto frio.
- não tem presunto.
- um queijo frio?
- tamo sem queijo.
- pão! Tem?
- claro que sim,aqui é uma padaria.
- então me vê um pão com manteiga.
- só margarina.
- tem suco de laranja?

Quando fiz essa pergunta,o homem me olhou como se eu o estivesse ofendendo. Como se eu entrasse numa farmácia pedindo cigarros. E me respondeu muito grosseiramente:
- guaravita.

Desse dia em diante a “padariazinha do interior” foi rebaixada a “padaria cansada”.
Voltamos pra casa e fomos novamente agraciados pelo doce som da flauta. Beethoven. A mesma peça. Resolvemos sentar um pouco na varanda e escutar a música inteira enquanto tomávamos aquele delicioso solzinho da manhã.
E foi então que a gente percebeu que nosso querido vizinho flautista nunca conseguia chegar ao final da música sem esbarrar num erro. E ele errava sempre na mesma parte.
Três semanas depois recebi a visita da síndica me dando duas notícias.
Uma, é que aquele quintal não me pertencia e sim ao condomínio,e que eu estaria proibida de fazer qualquer coisa nele porque o condomínio o transformaria em chão de cimento logo logo.
E a outra notícia, é que precisariam quebrar parte do chão da minha cozinha,por causa de uma porra de barbará que passava bem debaixo do meu chão,mas que seria coisa rápida.
E todas essas notícias vieram acompanhadas pela porra do som da flauta. Beethoven, a mesma peça. Errando-se no mesmo lugar. O filho da puta do vizinho tocava só essa música o dia inteiro,todos os dias e não aprendia. Errava sempre no mesmo lugar. E o mato crescendo...e eu não podendo fazer nada. Até rato apareceu naquele quintal de merda.
A rua,que era uma rua tranquila e querida,começou a ter roubo de carros as pencas. Todo dia era um carro roubado. Quando não conseguiam roubar, ficava aquele alarme ligado a madrugada inteira.
Uma manhã acordei com um novo som. Britadeira. Estavam demolindo o meu quintal,literalmente.
O homem da vida virou sapo,o quintal virou trapo,mas graças a Deus,o vizinho foi morar em Londres e a padaria cansada,agora já tem chapa e queijo. Presunto nem sempre...

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